Leandro Lima: “O Martírio Político no Brasil: de Lula a Bolsonaro”

De Lula a Bolsonaro, a narrativa do martírio político transforma processos judiciais em símbolos de resistência e aprofunda a polarização no Brasil.

Leandro Lima: “O Martírio Político no Brasil: de Lula a Bolsonaro”
Arquivo pessoal
Leandro Lima

O artigo de Leandro Lima analisa como o martírio político se consolidou no Brasil como estratégia de mobilização, primeiro com Lula em 2018, ao transformar sua prisão em símbolo coletivo do lulismo, e agora com Jair Bolsonaro, que usa o discurso de perseguição para manter coesa sua base, mesmo inelegível. Esse fenômeno desloca a disputa para o campo simbólico e emocional, em que instituições como o STF perdem legitimidade perante parte da sociedade, e a política se torna uma arena de lealdades quase tribais, marcada pela polarização e pela narrativa de que líderes encarnam causas maiores do que eles próprios.

O fenômeno do martírio político no Brasil ganhou expressão emblemática no discurso de Luiz Inácio Lula da Silva em 2018, às vésperas de sua prisão, quando declarou: “Eu não sou mais um ser humano, eu sou uma ideia”. Essa afirmação ultrapassa o papel de mera retórica, configurando uma estratégia política que transforma sua figura vulnerável em um símbolo coletivo maior que a própria pessoa. Ao afirmar que “quanto mais dias me deixarem lá, mais Lulas vão nascer neste país”, Lula converteu a adversidade judicial em capital político, fortalecendo a lealdade de uma base ampla e emocionalmente conectada. Essa transformação reposicionou o embate político para o campo simbólico, em que o corpo físico deixou de ser o centro da disputa para dar lugar à influência e à ideia do líder, garantindo a continuidade do lulismo mesmo na sua ausência.

Na atual conjuntura, observa-se um fenômeno similar com Jair Bolsonaro, que enfrenta a possibilidade de condenação no Supremo Tribunal Federal (STF) por suposta participação numa tentativa de golpe de Estado, mesmo já sendo inelegível para 2026. Pesquisas recentes da Quaest, de agosto de 2025, revelam um cenário de desconfiança profunda na corte, especialmente entre os eleitores bolsonaristas: 76% deles não confiam nos ministros do STF. Essa desconfiança alimenta o discurso que classifica as ações judiciais como perseguição política, fundamental para a mobilização da base bolsonarista, que enxerga as acusações não como questões jurídicas legítimas, mas como tentativas de “esmagar a oposição” e eliminar adversários políticos. Dessa forma, a deslegitimação das instituições fortalece a polarização e aprofunda a crise de confiança na democracia brasileira.

Essa polarização política, porém, transcende o campo das opiniões e se consolida como uma lealdade quase tribal, na qual a maioria dos eleitores age como torcedores apaixonados por seus líderes, mais preocupados com a vitória de sua “linha política” do que com a busca por justiça imparcial. Não importa se as denúncias são verdadeiras ou falsas, o que prevalece é a torcida fervorosa para que a figura política com quem se identificam saia vencedora, a qualquer custo. Esse comportamento transforma a política num espetáculo emotivo, em que narrativas de perseguição e martírio são usadas para legitimar líderes e ampliar a polarização cultural e social, enraizando conflitos que ultrapassam o racional e se tornam essencialmente afetivos.