Juvenal Araújo: “O impacto do racismo estrutural na economia brasileira”

O artigo de Juvenal Araújo mostra como o racismo estrutural no Brasil não é apenas uma questão social, mas também um entrave econômico grave.

Juvenal Araújo: “O impacto do racismo estrutural na economia brasileira”
Juvenal Araujo

O racismo estrutural no Brasil não é apenas uma questão ética ou social. Ele tem impacto econômico direto e mensurável, reduzindo a produtividade, ampliando desigualdades e limitando o desenvolvimento do país. Ao manter parte significativa da população em desvantagem, a economia nacional perde eficiência, inovação e capacidade de crescimento sustentável. Ignorar esse problema custa caro, tanto para indivíduos quanto para empresas e para o Estado.

Os dados mais recentes evidenciam a profundidade dessa desigualdade. De acordo com a Síntese de Indicadores Sociais do IBGE, divulgada em 2024, a hora trabalhada de uma pessoa branca vale, em média, 67,7% a mais do que a de trabalhadores pretos e pardos. Isso significa que, enquanto um negro ou pardo recebe cerca de R$ 13,70 por hora, um trabalhador branco recebe aproximadamente R$ 23,00. Essa diferença persiste inclusive entre aqueles que possuem ensino superior completo, revelando que não se trata apenas de um déficit educacional, mas de um reflexo direto do racismo estrutural que permeia o mercado de trabalho.

Outro dado alarmante é o desemprego. Estudo do Dieese, baseado na PNAD Contínua de 2023, mostrou que negros correspondem a 56,1% da população em idade ativa, mas representam 65,1% dos desempregados. Entre mulheres negras, a taxa de desocupação chega a 11,7%, acima da média nacional. Além disso, a informalidade, marcada pela ausência de proteção social e estabilidade, também atinge de forma mais intensa essa parcela da população. Esses números revelam um ciclo perverso: maior exposição à precarização do trabalho e menores oportunidades de ascensão.

A sub-representação em cargos de comando é outro reflexo dessa desigualdade. Apenas 2,1% dos trabalhadores negros ocupam funções de direção ou gerência, contra 5,5% dos não negros. Pesquisas realizadas pelo LinkedIn reforçam esse quadro: 93% dos profissionais negros afirmam enfrentar barreiras para alcançar posições de liderança. Isso evidencia que o teto de vidro racial ainda é uma realidade no Brasil, bloqueando talentos que poderiam contribuir de maneira decisiva para a inovação e competitividade das empresas.

Além disso, relatórios do Centro de Estudos e Dados sobre Desigualdades Raciais (CEDRA) apontam que a desigualdade salarial entre brancos e negros aumentou em determinadas faixas de renda na última década. Entre homens brancos e mulheres negras que recebem acima de cinco salários mínimos, a diferença passou de cerca de 7,5% para 9,5% entre 2012 e 2023. Ou seja, em vez de diminuir, a disparidade avança em segmentos mais altos, reforçando o caráter persistente do problema.

Esses indicadores não são apenas estatísticas frias. Eles têm impacto real na dinâmica da economia. A baixa inserção da população negra em empregos formais e de qualidade reduz a produtividade agregada do país, já que parcela expressiva da força de trabalho permanece subutilizada. A diferença salarial limita a renda média nacional, o que restringe o consumo, reduz investimentos privados e compromete a arrecadação tributária. Além disso, a exclusão social provoca maior dependência de programas assistenciais, aumentando gastos públicos em áreas que poderiam ser aliviadas com políticas de inclusão e promoção de equidade.

Outro efeito indireto é a instabilidade social. Desigualdades raciais persistentes minam a confiança nas instituições, ampliam tensões sociais e reduzem a legitimidade de políticas públicas. Esse ambiente de insegurança afeta o investimento privado, encarece custos de governança e compromete a imagem internacional do Brasil. Em resumo, o racismo estrutural não apenas limita a vida de milhões de cidadãos, como também se traduz em entraves concretos ao desenvolvimento econômico nacional.

Enfrentar esse cenário exige políticas públicas e empresariais consistentes. A ampliação de políticas afirmativas, como cotas raciais em concursos e universidades, é um passo fundamental. Mais do que isso, é preciso que empresas adotem metas claras de diversidade, garantindo representatividade também em cargos de liderança. Transparência salarial, auditorias independentes e relatórios de diversidade podem ser instrumentos eficazes para reduzir desigualdades. Investimentos em capacitação e programas de mentoria voltados à juventude negra também são essenciais para abrir portas e reduzir a disparidade de oportunidades.

Do ponto de vista macroeconômico, medidas que incentivem a formalização do trabalho e valorizem profissões tradicionalmente ocupadas por pessoas negras, como o serviço doméstico e funções de limpeza, também podem ajudar a diminuir o fosso salarial. Ajustes fiscais que garantam financiamento sustentável para programas de equidade racial são igualmente necessários. Afinal, equidade não é custo: é investimento em capital humano.

O racismo estrutural, portanto, é mais do que uma injustiça histórica. Ele é um obstáculo econômico que corrói a eficiência produtiva do Brasil e compromete seu futuro. Ao manter milhões de brasileiros em posições de desvantagem, o país desperdiça talentos, reduz sua capacidade de inovar e perde competitividade no cenário global. Enfrentar esse problema não é apenas uma questão de justiça social: é uma estratégia fundamental de desenvolvimento. O custo da inércia é alto demais. Se o Brasil deseja ser um país mais próspero e justo, precisa colocar a redução das desigualdades raciais no centro de sua agenda econômica.