
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes fez duras críticas à proposta que pretende classificar facções criminosas como organizações terroristas, hoje em debate na Câmara dos Deputados. Para ele, o projeto de lei representa “um excesso de politização” e não é necessário para o enfrentamento do crime organizado no Brasil.
“Não vamos necessitar disso. Precisamos tratar o crime dentro dos padrões normais da institucionalidade. Há muita bravata em torno desse tema e um excesso de politização”, afirmou o ministro durante evento do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), em Buenos Aires, do qual é cofundador.
A proposta em tramitação prevê equiparar grupos como o Comando Vermelho (CV) e o Primeiro Comando da Capital (PCC) a organizações terroristas. A medida ganhou força após a megaoperação no Rio de Janeiro, que deixou 121 mortos e reacendeu o debate sobre o papel do Estado no combate ao crime. Governadores como Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP), Romeu Zema (Novo-MG) e Ronaldo Caiado (União-GO) têm defendido publicamente a aprovação da lei.
O governo federal, entretanto, é abertamente contrário à proposta. A ministra da Secretaria de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, afirmou que a medida “abre brechas perigosas” e poderia permitir intervenções internacionais em território nacional. “Terrorismo tem objetivo político e ideológico. Pela legislação internacional, essa classificação permitiria que outros países alegassem o direito de intervir no Brasil”, explicou a ministra, reforçando que o país já dispõe de leis eficazes para combater o crime organizado.
Em vez da equiparação ao terrorismo, o Planalto aposta no chamado projeto antifacção, já enviado ao Congresso. O texto altera leis como o Código Penal, o Código de Processo Penal, a Lei dos Crimes Hediondos e a Lei de Execução Penal, prevendo aumento de penas para líderes de facções e a criação de um Banco Nacional de Organizações Criminosas, destinado a centralizar informações sobre grupos atuantes em todo o território nacional.
Para Gilmar Mendes, o desafio da segurança pública exige técnica, coordenação e institucionalidade não retórica política. “O combate ao crime deve fortalecer as instituições, não enfraquecê-las. Quando tudo vira slogan, o risco é a lei se tornar instrumento de conveniência ideológica”, concluiu.
A fala de um dos ministros mais experientes do STF reforça a tensão entre o discurso político e o pragmatismo jurídico na definição de políticas de segurança pública no país.