Tesouro alerta para fragilidade financeira em nove estatais federais

Correios, Casa da Moeda, Infraero e Eletronuclear estão entre as empresas que podem exigir aportes da União e pressionar as contas públicas

Tesouro alerta para fragilidade financeira em nove estatais federais

O Tesouro Nacional acendeu um alerta sobre a situação financeira de nove estatais federais, incluindo companhias estratégicas como Correios, Casa da Moeda, Infraero e ENBPar empresa que controla a Eletronuclear. O diagnóstico, apresentado no 7º Relatório de Riscos Fiscais da União, aponta que esses órgãos apresentam desequilíbrios estruturais, prejuízos recorrentes e risco concreto de necessitarem de apoio financeiro da União, o que pode impactar o equilíbrio das contas públicas.

O documento, elaborado pelo Ministério da Fazenda, analisa 27 estatais federais 22 empresas públicas e 5 sociedades de economia mista e serve como um raio-x anual do potencial de risco fiscal do governo. Segundo o relatório, qualquer aporte em estatais deficitárias representa uma despesa direta no Orçamento, ampliando o déficit e comprometendo a trajetória da dívida pública.

Entre os casos mais preocupantes está o dos Correios, que acumulam um prejuízo de R$ 2,64 bilhões no segundo trimestre de 2025, quase cinco vezes maior que no mesmo período de 2024. A estatal, que enfrenta queda de receitas e alto custo com pessoal, tenta viabilizar um empréstimo de R$ 20 bilhões com bancos públicos e privados, com aval do Tesouro. Embora o governo veja o crédito como saída temporária, a operação dependerá de um aval técnico por conta da fragilidade financeira da empresa.

A Eletronuclear, administrada pela ENBPar, também preocupa o Tesouro. A companhia pediu socorro de R$ 1,4 bilhão para evitar um colapso no caixa e tenta viabilizar recursos para finalizar a construção de Angra 3, projeto que já ultrapassa R$ 20 bilhões em custos acumulados. Especialistas apontam que a situação ameaça não apenas o cronograma da obra, mas a estabilidade do setor energético sob controle público.

Outras empresas que figuram na lista de vulnerabilidade incluem a Casa da Moeda, com lucro 74% menor em 2024 e resultado operacional negativo, e a Infraero, que viu sua receita líquida despencar 71% após a concessão de aeroportos. Já entre as companhias docas, cinco apresentam risco de deterioração financeira: Ceará, Pará, Bahia, Rio de Janeiro e Rio Grande do Norte esta última, dependente em 72% da receita do Porto de Maceió, que pode ser desvinculado da administração da empresa.

O Tesouro estima que o déficit das estatais federais alcance R$ 6,2 bilhões em 2025 e suba para R$ 6,7 bilhões em 2026. A dívida bruta do governo, por sua vez, deve atingir 79% do PIB até o fim de 2025, segundo as projeções da Fazenda, e continuar crescendo até 2028.

Apesar das dificuldades, o relatório destaca que os bancos públicos federais Banco do Brasil, Caixa, BNDES, Banco do Nordeste e Basa mantêm solidez e baixo risco de aporte emergencial. Juntos, esses bancos já repassaram R$ 23,7 bilhões em dividendos e juros sobre capital próprio ao Tesouro apenas no primeiro semestre de 2025, o que representa mais da metade da meta anual.

O economista Fernando Soares, ex-secretário de Coordenação e Governança das Estatais, avalia que os casos mais críticos são os dos Correios e da Eletronuclear, pela combinação de custos elevados, má gestão e influência política. “Nos Correios, 70% das receitas vão para gastos com pessoal e planos de saúde. Já no caso da Eletronuclear, os investimentos em Angra 3 são um risco bilionário para o Tesouro”, afirma.

Para ele, a solução passa por atrair investimento privado para as áreas mais deficitárias, especialmente nas companhias docas, por meio de concessões e parcerias. “Não se trata mais apenas de privatização, mas de permitir que o setor privado invista na infraestrutura portuária e garanta competitividade”, conclui.

Em nota, os Correios afirmaram estar implementando um plano de reestruturação com foco em modernização e sustentabilidade financeira até 2027, com apoio técnico do Tesouro. A estatal disse ainda que o governo atua como garantidor das operações de crédito, “sem previsão de aporte direto de recursos públicos”.

O relatório do Tesouro, contudo, reforça um ponto central: a vulnerabilidade de parte das estatais brasileiras é resultado de anos de interferência política e falta de governança técnica. E, enquanto algumas delas tentam se reerguer, o risco fiscal que representam segue no radar de Brasília um lembrete de que o peso da má gestão pública ainda recai sobre o bolso do contribuinte.