Venezuelanos são deixados em rodoviária mineira

Grupo de 41 migrantes, incluindo 27 crianças, foi trazido da Bahia sem aviso prévio; Montes Claros aciona rede de proteção e cobra apuração sobre o transporte irregular.

Venezuelanos são deixados em rodoviária mineira
Luiz Ribeiro/EM/D.A Press

A madrugada ainda mal havia começado quando 41 venezuelanos, entre eles 27 crianças e quatro gestantes desembarcaram, sem destino e sem orientação, na rodoviária de Montes Claros, no Norte de Minas. As famílias, que viviam em Itabuna, na Bahia, afirmam ter sido despejadas de imóveis alugados após a interrupção do pagamento de aluguéis que, segundo relataram, eram custeados pela prefeitura local. Transportadas em ônibus e até um pequeno caminhão, chegaram à cidade mineira sem qualquer aviso prévio às autoridades locais.

A cena mobilizou a Prefeitura de Montes Claros, que acionou a Polícia Militar para registrar o caso e buscou apoio imediato para garantir alimentação, abrigo e cuidados básicos. No início da tarde, os migrantes foram encaminhados ao Ginásio Municipal Ana Lopes, onde passariam a noite em colchões instalados na quadra, em condições improvisadas de acolhimento. O espaço, usado normalmente para treinos de modalidades esportivas, foi esvaziado para receber as famílias, interrompendo atividades programadas para o fim de semana.

A Polícia Federal também foi chamada para avaliar a situação migratória do grupo. Os agentes confirmaram que as famílias vivem há quatro anos no Brasil, desde que deixaram a Venezuela para escapar da crise econômica e social agravada pelo regime de Nicolás Maduro. O grupo viajava acompanhado de seus pertences, além de dois cachorros e um coelho, tentando preservar os poucos vínculos que ainda carregam consigo.

Diante da urgência humanitária, secretários municipais de várias pastas — Desenvolvimento Social, Segurança Institucional, Defesa Civil, Educação, Saúde e Esportes — reuniram-se para organizar uma força-tarefa. O objetivo é garantir assistência imediata e discutir, com base no diálogo com os próprios migrantes, qual poderá ser o caminho para essas famílias nos próximos dias. Kits de higiene, colchões, alimentação e acompanhamento social estão entre as primeiras medidas adotadas.

A prefeitura também convidará o Ministério Público e a Defensoria Pública para integrar as discussões. Uma reunião intersetorial está marcada para segunda-feira (17/11), quando serão avaliadas alternativas de médio e longo prazo. Segundo o secretário de Desenvolvimento Social, André Kevin, as decisões deverão respeitar a autonomia dos imigrantes: “Eles têm direito de ir e vir. Podem permanecer aqui ou seguir para outras cidades. O papel do município é garantir acolhida e proteção.”

A situação, porém, está longe de se estabilizar. Durante a abordagem, o cacique do grupo, Amário Mota, apresentou um documento que apontaria um nome da Prefeitura de Itabuna como responsável pelo envio das famílias a Montes Claros. A administração mineira afirma que não recebeu qualquer comunicação prévia e que não participou, autorizou ou concordou com o transporte. A reportagem tentou contato com a Prefeitura de Itabuna, mas não obteve retorno.

Para agravar o cenário, há a previsão de chegada, já na próxima semana, de mais 14 venezuelanos vindos de Vitória da Conquista (BA). A informação acendeu um alerta entre as autoridades municipais, que acompanham o caso com preocupação crescente.

À tarde, o prefeito Guilherme Guimarães visitou o ginásio para avaliar as condições do local. Ele reconheceu que a estrutura não foi projetada para alojamento, mas reforçou que nenhuma família ficará desamparada. A gestão municipal trata o caso como um episódio “complexo”, marcado pela vulnerabilidade extrema dessas famílias que, mesmo após quatro anos no Brasil, seguem enfrentando deslocamentos forçados e incertezas sobre o próprio futuro.

Ao final do dia, a Prefeitura de Montes Claros reafirmou seu compromisso com a dignidade humana e declarou que continuará atuando para garantir proteção e atendimento emergencial aos migrantes. Enquanto isso, resta a expectativa: quem responderá pelo envio irregular dessas famílias e qual será o próximo capítulo na busca dessas pessoas por um lugar onde possam, enfim, recomeçar?