COP 30 já consome quase R$ 1 bilhão em gastos públicos

Com quase R$ 1 bilhão em gastos públicos, conferência do clima expõe os desafios de conciliar discurso ambiental, eficiência na gestão e transparência no uso dos recursos.

COP 30 já consome quase R$ 1 bilhão em gastos públicos

A Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a COP 30, oficialmente aberta pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), ainda nem começou e já se tornou símbolo de um paradoxo do governo: o de sustentar o discurso da sustentabilidade diante de um custo que se aproxima de R$ 1 bilhão aos cofres públicos. Segundo dados do Portal da Transparência e do sistema Siga Brasil, do Senado Federal, R$ 775,9 milhões já foram efetivamente pagos até o início de novembro.

Para organizar o evento, o governo federal firmou um contrato de R$ 946,9 milhões com a Organização de Estados Ibero-Americanos (OEI), entidade internacional sediada em Madri, responsável pela execução de projetos de cooperação em educação, ciência e cultura. A maior parte dos recursos, cerca de R$ 789,9 milhões, está sob gestão direta da Presidência da República, além de R$ 66,5 milhões em restos a pagar — compromissos financeiros que deverão ser quitados nos próximos meses.

Lula definiu a conferência como “a COP da verdade”, prometendo um debate realista sobre o futuro ambiental do planeta. Mas, enquanto o governo se prepara para receber mais de 50 mil participantes em Belém, entre chefes de Estado, delegações internacionais e representantes da sociedade civil, cresce o debate sobre a proporcionalidade dos gastos e a ausência de mecanismos mais robustos de transparência e prestação de contas.

O evento também coloca em foco uma questão recorrente na administração pública brasileira: o custo da imagem internacional. Desde a Rio-92, passando pela COP 25 em Madri e a Rio+20, o Brasil tem alternado momentos de protagonismo e críticas por supostos excessos orçamentários em grandes conferências. A diferença agora é o contexto de ajuste fiscal e de cobrança por eficiência em um governo que busca reposicionar o país no debate global sobre o clima.

Especialistas em políticas públicas avaliam que o impacto institucional de gastos dessa magnitude exige maior controle e accountability. A execução orçamentária de eventos internacionais, embora comum, demanda rigor técnico e transparência, sob pena de corroer a credibilidade do discurso ambientalista. Como lembra um ex-diretor do Tesouro ouvido pela reportagem, “não há sustentabilidade possível se a gestão pública não for sustentável também”.

Além dos efeitos econômicos imediatos, a COP 30 se transforma em um teste de coerência política para o governo Lula. Ao mesmo tempo em que promete liderança mundial na agenda verde, o Planalto precisa mostrar que a mobilização de quase R$ 1 bilhão para uma conferência se traduzirá em legado concreto para a população amazônica e em políticas ambientais eficazes, e não apenas em uma vitrine de discursos.

Em um país marcado por casos recorrentes de má gestão em grandes eventos de conferências internacionais a megaobras esportivas, o debate sobre a ética na administração pública ganha peso renovado. A boa governança, neste caso, não se mede apenas pela grandiosidade do evento, mas pela capacidade de transformar investimento público em resultados duradouros.

A COP 30 será, mais do que uma conferência climática, um espelho da governança brasileira. E o que ele refletir pode dizer muito sobre o futuro da credibilidade do país na política global e sobre o compromisso real de um governo que promete enfrentar as mudanças climáticas sem esquecer de enfrentar, também, as suas próprias.