Ex-sócio de filho de Lula lavava dinheiro do PCC, afirma Polícia Federal

Documentos da Operação Colossus revelam como uma engrenagem financeira opaca conectou negócios da Educação, tráfico de influência e canais usados por organizações criminosas e terroristas.

Ex-sócio de filho de Lula lavava dinheiro do PCC, afirma Polícia Federal

A Polícia Federal segue desvendando uma complexa rede financeira que entrelaça empresas ligadas ao setor educacional, operadores do mercado de criptoativos e mecanismos utilizados pelo crime organizado e por grupos extremistas no exterior. No centro desse novo avanço investigativo está a Life Tecnologia Educacional, de André Mariano preso na Operação Coffee Break suspeita de ter recorrido a estruturas de evasão de divisas mapeadas na Operação Colossus, que já identificou um fluxo de R$ 61 bilhões em transações suspeitas. A PF aponta que parte das empresas utilizadas pela Life para movimentações financeiras também atuava para operadores ligados ao PCC e a redes de câmbio informal associadas ao Hezbollah.

A investigação também acende luz sobre possíveis relações de influência para obtenção de contratos públicos. Segundo os investigadores, Mariano pagava valores regulares ao empresário Kalil Bittar, ex-sócio de Fábio Luís Lula da Silva, o Lulinha, em um suposto acordo de tráfico de influência destinado a facilitar a entrada da Life em contratos educacionais em governos estaduais e no governo federal. A proximidade histórica de Bittar com a família do presidente Lula ampliou o nível de atenção sobre a atuação do empresário. As defesas afirmam que não há irregularidades e que os envolvidos estão à disposição da Justiça.

Para compreender o caminho do dinheiro, a PF concentrou esforços em uma empresa-chave: a APS Soluções Digitais. Em 2022, a APS recebeu da Life R$ 1,1 milhão em três transferências que, segundo os investigadores, antecederam ou sucederam repasses equivalentes a outras empresas já monitoradas. No total, a APS movimentou mais de R$ 1,2 bilhão no ano, distribuídos em seis mil operações. Parte expressiva desses valores foi direcionada à ZM Consultoria, controlada por Vinícius Zampieri Marinho, investigado na Colossus. A sequência temporal dos depósitos sugere, para a PF, uma tentativa deliberada de dissimular a verdadeira origem e o real destino dos recursos. A defesa de Marinho nega irregularidades e diz que o empresário sempre atuou com transparência.

O fluxo de recursos também expôs a relevância de bancos e instituições financeiras que operam no modelo BaaS (Banking as a Service). Mais de 98% das transferências feitas pela APS seguiram para contas no Banco Topázio e na Acesso Soluções de Pagamentos, ambos sob investigação por suspeita de irregularidades no sistema financeiro nacional. A PF observa que essas instituições oferecem soluções rápidas de câmbio e aquisição de criptoativos justamente um dos ambientes mais explorados para evasão de divisas e lavagem de dinheiro.

Além da ZM Consultoria, outras empresas despontam no radar. A Revo Capital, que atua no mercado de criptoativos, recebeu da APS mais de R$ 254 milhões em pouco menos de um ano. A OWS Brasil, ligada a uma holding sediada em Miami, movimentou sozinha R$ 13 bilhões em operações suspeitas, embora não estivesse originalmente no centro da Colossus. Já a Mozzatto Consultoria, controlada por Thiago Mozzatto — ex-diretor do 2 Go Bank, fintech acusada de operar para o PCC recebeu mais de R$ 4 milhões em operações semelhantes. A teia se expande a partir de nomes improváveis, como o proprietário da Cash Back Turismo, empresa que movimentou R$ 10 bilhões apesar de seu dono morar em um barraco na favela de Heliópolis.

O relatório da PF conclui que a APS atuava como um canal facilitador, permitindo que valores de origem ilícita circulassem rapidamente até operadores especializados na conversão em criptoativos ou em remessas internacionais. Segundo a análise, os dados ainda não foram totalmente processados, e parte significativa das informações bancárias permanece em tratamento no sistema do Ministério Público Federal. Para os investigadores, isso significa que a dimensão real do esquema pode ser muito maior.

A conclusão mais contundente do documento é que, à medida que o crime organizado sofisticou sua atuação financeira, passou a utilizar os mesmos mecanismos explorados por esquemas de corrupção e sonegação. A intersecção entre recursos públicos, operadores privados, empresas de fachada e circuitos internacionais de criptoativos tornou-se uma zona cinzenta onde fluxos legais e ilegais se confundem. O desafio, reforça a PF, é seguir o rastro do dinheiro ainda que ele atravesse fronteiras, criptografia e intermediários que operam à margem da lei.