
- Períodos que podem chegar a décadas ampliam o risco de cometimento de abusos; postura adotada pelo ministro Barroso deveria servir de exemplo
- Há excesso de medidas monocráticas, assim como o hábito de reterem processos por prazos muito acima do razoável
Ao anunciar sua aposentadoria no Supremo Tribunal Federal, o ministro Luís Roberto Barroso fez uma confissão que nos parece auspiciosa. Disse que é um admirador do modelo alemão de mandato, em que os ministros da Suprema Corte permanecem por, no máximo, 12 anos na função. Ele próprio mal passou de 12 anos —12 anos e três meses— e, se assim quisesse, poderia permanecer no tribunal até 2033, conforme a vitaliciedade reconhecida na legislação brasileira.
Barroso fez ainda uma menção à longevidade dos mandatos em nosso país, embora evitasse fazer juízos de mérito. Nós podemos fazer. Temos hoje no nosso Supremo dois ministros que poderão permanecer ainda por longo tempo. São os casos de Dias Toffoli, que chegou ao cargo com 41 anos, após certo período de carreira no PT, e poderá ficar no cargo até 2041, perfazendo, portanto, nada menos do que 33 anos no cargo. Também está lá Cristiano Zanin, que chegou ao Supremo aos 47 anos e só sairá de lá, em tese, na aposentadoria compulsória em 2050, após 28 anos.
Sempre acreditei que os mandatos extensos demais levavam a cúpula do Judiciário a cometer abusos, quando menos por esclerosar o pensamento jurídico brasileiro. Logo no início de meu mandato, em 19 de março de 2019, apresentei a PEC 16 para alterar o art. 101 da Constituição Federal, que versa sobre o processo de escolha dos ministros do STF, para fixar os respectivos mandatos em oito anos. Levei aí em consideração não apenas a extensão demasiadamente longa dos períodos no cargo, mas também os poderes de que gozam os ministros; alguns previstos em normas, outros nem isso.
É o caso do excesso de medidas monocráticas, assim como do hábito de reterem processos por prazos muito acima do razoável, inclusive desafiando decisões em contrário. É o caso também, cada vez mais frequente, na interferência em outros Poderes; o que significa, na prática, tomar medidas que, constitucionalmente, cabem ao Congresso. Temos dezenas de casos recentes, como do aborto, do licenciamento ambiental e tantos outros em que a corte atropela as demais esferas de Poder, transformando-se em violador da Constituição.
Derivam também dessa onipotência os procedimentos que aqui apelidamos de “cavalos de pau” jurídicos, as mudanças repentinas e inesperadas nos entendimentos legais, fonte extrema de uma insegurança jurídica incompatível com o elevado papel do Supremo. Poderíamos citar vários exemplos, mas o mais notório foi a decisão sobre possibilidade de prisão após condenação em segunda instância, que mudou quatro vezes em pouco mais de seis anos.
Respeito, ao mesmo tempo que registro com entusiasmo, a postura adotada pelo ministro Barroso. Ainda acredito que o ideal seria um prazo menor, com os oito anos que propus em 2019. Os danos causados por esse mandato frequentemente longo demais já foram comprovados. Espero que a postura adotada pelo ministro Barroso contribua agora para o andamento da proposta de emenda constitucional que apresentei ou de qualquer outra que corrija as distorções do sistema atual.